leitura: Catarina Cardoso – 9º ano (2021-22)
poema: “Uma pequenina luz”, de Jorge de Sena
Uma pequenina luz Uma pequenina luz bruxuleante não na distância brilhando no extremo da estrada aqui no meio de nós e a multidão em volta une toute petite lumière just a little light una piccola… em todas as línguas do mundo uma pequena luz bruxuleante brilhando incerta mas brilhando aqui no meio de nós entre o bafo quente da multidão a ventania dos cerros e a brisa dos mares e o sopro azedo dos que a não veem só a advinham e raivosamente assopram. Uma pequena luz que vacila exata que bruxuleia firme que não ilumina apenas brilha. Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda. Muda como a exatidão como a firmeza como a justiça. Brilhando indefetível. Silenciosa não crepita não consome não custa dinheiro. Não é ela que custa dinheiro. Não aquece também os que de frio se juntam. Não ilumina também os rostos que se curvam. Apenas brilha bruxuleia ondeia indefetível próxima dourada. Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha. Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha. Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha. Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha. Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não: brilha. Uma pequenina luz bruxuleante e muda como a exatidão como a firmeza como a justiça. Apenas como elas. Mas brilha. Não na distância. Aqui no meio de nós. Brilha. Jorge de Sena (1919-1978)