a realidade nunca é branca

foto: Flávio Costa – 10º ano (2021-22)

poema: “Cores”, de Nuno Júdice

CORES

Há uma parede branca em todos os verões que trouxe
da memória. Apetece-me escrever nela; e rasga-se
como se fosse uma folha. No outono, essa parede
escurece. No inverno, o musgo enche-a de uma escrita
incompreensível. Sei onde está, quando preciso de
me encostar à sua sombra. Uma poeira de cal agarra-
-se-me aos dedos. Gosto de ver a brancura da pele,
sob o sol intenso, e de a comparar com o branco
da parede. Mas nem sempre o mundo se reduz a um ob-
jeto tão simples; nem os seus problemas desaparecem
com uma simples camada de tinta. A realidade nunca
é branca, como esta parede: escurece com o outono,
enche-se de musgo no inverno, e ninguém a procura, 
no verão, quando o poente a tinge de vermelho.

Nuno Júdice (1949- )

biobibliografia

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